15.9.12

Concursos Literários no site Pra Ler


O Pra Ler - que conta com um site e um programa de rádio, que é veiculado toda quinta-feira, às 16:15, na Rádio UFMG Educativa (104,5 FM ou www.ufmg.br/radio) - publicou uma série de matérias sobre Concursos Literários que contou com minha colaboração, como entrevistado.

Seguem abaixo as três matérias:

[Série] Concursos literários – Atrás dos pseudônimos
Escrito por Julia Marques
27 de agosto de 2012

No último dia de 1937, um jovem de 29 anos, escondido pelo pseudônimo Viator, apostava suas fichas em um calhamaço com mais de 500 páginas de contos datilografados para um concurso literário. O prêmio era bom: a publicação do livro pela Editora José Olympio, tradicional editora brasileira e pertencente ao Grupo Record desde 2001. Depois de descartar obras “menos sólidas”, uma comissão julgadora formada por ninguém menos que Prudente de Morais, Dias da Costa, Peregrino Junior, Marques Rebelo e Graciliano Ramos enfrentou a difícil missão de permanecer unida após o concurso. Entre os finalistas, estava a obra do desconhecido Viator e outra coletânea de contos muito mais enxuta, de Luiz Jardim, um veterano em prêmios literários.

Quase se estapearam na hora de decidir entre os dois. Graciliano quis o livro menor. Dias da Costa, também. Insatisfeito, Marques Rebelo “gritou, espumou, fez um número excessivo de piruetas ferozes” – como esclareceria o próprio colega Graciliano anos depois – e deu seu voto para Viator. Prudente foi atrás. Peregrino foi quem decidiu. Venceram a democracia e o livro Marias perigosas, de Luiz Jardim. Nove anos mais tarde, Viator lançou seu livro pela Editora Universal, no Rio de Janeiro. A primeira edição de Sagarana em poucos dias se esgotou e um novo autor começava a chamar atenção no meio literário: João Guimarães Rosa.

Primeira edição de Sagarana

Mais de 70 anos se passaram desde que essa história aconteceu, mas ainda hoje as editoras buscam a via do concurso literário para descobrirem bons autores. Também não é raro que os julgadores gritem e espumem, assim como fez Marques Rebelo, para darem a vitória ao livro que mais lhes agradou. E no mundo à parte dos concursos literários, atrás de seus pseudônimos, os autores se movimentam em busca de fazer conhecida a sua verdadeira identidade. Poucos conseguem, outros tantos permanecem Viatores.

Tour pelos prêmios

Concursos literários existem há muitas décadas no Brasil, mas talvez o Prêmio Humberto de Campos, do qual Guimarães Rosa participou, não fosse tão concorrido quanto o são hoje outras competições literárias até menos tradicionais. De uns anos pra cá, com a popularização da internet, concursos que já existiam ganharam uma maior divulgação. O editor do blog Concursos Literários, Rodrigo Domit, explica que após a criação das redes sociais e suas comunidades, ficou mais fácil encontrar pessoas com interesses comuns e dispostas a compartilhar conteúdo. “Acredito que a comunidade ‘Concursos Literários’ no Orkut, no ar desde 2004, foi um marco para ampliar a divulgação de certames”, destaca.
O próprio blog de Rodrigo é um dos espaços de maior divulgação dos concursos literários. O endereço está no ar há apenas um ano e meio, mas apesar da pouca idade já dá passos grandes. Rodrigo foi quem criou o domínio, mas conta hoje com dez colaboradores, das cinco regiões do país. O objetivo é garimpar o maior número de concursos literários espalhados pelo Brasil e levar os editais ao conhecimento dos escritores. “A gente sai à caça e já fechei o mês com 48 concursos”, conta.
A maioria dos concursos literários hoje está localizada nas regiões Sudeste e Sul do país. Mas todos os estados já contaram com pelo menos um certame. Se as capitais concentram maior número de prêmios, cidades menores como Ituiutaba, em Minas Gerais, e Passo Fundo, no Rio Grande do Sul, comandam a realização de premiações muito renomadas e tradicionais.





[Série] Concursos literários – Gêneros Diversos
Escrito por Julia Marques
29 de agosto de 2012

Basta um pequeno passeio pelos editais dos concursos literários para saber que eles não são, nem de longe, iguais. As diferenças vão desde a nascente – quem patrocina – até a foz – a forma de entrega da premiação. Nesse percurso, existem ainda muitos meandros.

De acordo com Rodrigo Domit, editor do blog Concursos Literários, as maiores fontes patrocinadoras de concursos no país são estatais, como prefeituras, secretarias de cultura, fundações culturais e bibliotecas públicas; ou paraestatais, como o Serviço Social do Comércio (Sesc). Em seguida, no ranking dos que mais promovem esse tipo de atividade, estão as instituições literárias ou relacionadas à literatura, como as academias de letras, editoras, livrarias e revistas.

As regras para a participação também variam muito. Concursos como o Jabuti – o mais importante prêmio literário do Brasil, lançado em 1959 – não premiam autores inéditos, mas sim obras já publicadas. Outros, ao contrário, exigem que o texto ainda não tenha circulado no meio literário, o que significa que a obra não pode ter sido impressa ou até mesmo disponibilizada para leitura em blogs ou sites.

Troféu do Prêmio Jabuti, por Danilo Máximo

Para alguns editais, é possível tirar da gaveta um poema ou um conto antigo e participar. Outros exigem um esforço maior: é preciso ter não só uma, mas sim um livro inteiro de poesias antes de se inscrever. Para os que têm bom poder de síntese, já existem concursos próprios para os microblogs, como o que a Academia Brasileira de Letras lançou em 2010. A exigência era fazer um microconto com apenas 140 caracteres, um tweet.

Os gêneros literários premiados também variam inclusive em um mesmo concurso. É o caso, por exemplo, do Prêmio Literário Livraria Asabeça, organizado pela Editora Scortecci. “A cada ano, o Prêmio é organizado e planejado de uma forma diferente. Esse ano ele está contemplando livro de poesia e livro de contos. Ano que vem vai ser uma novela e um romance”, anuncia o editor responsável pelo certame, João Scortecci. O prêmio da Asabeça é a publicação do livro. Outros concursos dão quantias em dinheiro e existem aqueles que garantem, ao contrário, bons gastos.

Prêmio que não é prêmio
“Verdadeiros estelionatários, que cobram pela inscrição, pela publicação e, em alguns casos, não chegam nem a entregar a obra”. Assim o editor do blog Concursos Literários caracteriza os prêmios conhecidos pelos escritores como caça-níqueis. Para evitar que autores iniciantes caiam nesse tipo de armadilha, o blog não divulga concursos que cobrem taxa de inscrição.

O escritor Rafael Clodomiro foi vencedor do prêmio UFF de Literatura, da Universidade Federal Fluminense, em 2009, na categoria Poesia. Na comunidade do Clube dos Autores, ele organizou um fórum só para debater os concursos literários com outros escritores. Rafael aconselha que os autores iniciantes tenham atenção especial aos concursos que cobram taxas. “É nestes que estão os maiores problemas. Logicamente, quando você paga alguma coisa, você espera um retorno muito bom, principalmente na premiação, avaliação e divulgação. E, se um desses quesitos não acontece, os autores se sentem frustrados”, explica.

Mas a taxa de inscrição pode não ser um indicativo absoluto da má qualidade. Concursos considerados sérios, como o Jabuti, fazem esse tipo de cobrança e estão longe de serem estelionatários. Para o escritor Alexandre Lobão, que dá dicas a autores em seu site, é preciso, mais do que verificar se há taxas, olhar para o histórico da entidade que promove o concurso e avaliar os editais. Se a promessa é publicar uma coletânea custeada pelos próprios autores, pode não valer muito a pena. Alexandre destaca, entretanto, que mesmo os concursos considerados caça-níqueis podem não ser uma roubada tão grande quanto parecem. “Às vezes o cara é um autor inédito, quer publicar o trabalho dele. Ele entra lá, gasta de repente 30 reais para fazer uma inscrição. Se ele for selecionado vai ser um trabalho dele, por mais que seja uma coisa que digamos não é muito séria, reconhecida”, pondera.





[Série] Concursos literários – Do outro lado do texto
Escrito por Julia Marques
6 de setembro de 2012

Assim como os concursos, as motivações para participar também são diferentes e dependem do autor e sua posição no meio literário. O escritor Alexandre Lobão conta que atualmente só participa do concurso de Ficção Científica Brasileira (FC do B), idealizado em 2004 pela Book House Boys, com o objetivo de se divertir. Mas no início de sua carreira, Lobão considera que os concursos foram importantes para que ele continuasse escrevendo.

Autores que nunca publicaram encontram nos concursos literários um aval para a qualidade de suas obras. Rodrigo Domit, editor do blog Concursos Literários, acredita que o que leva as pessoas a começarem a participar é a ansiedade por saber se alguém que não conhecem e que entende de literatura vai gostar daquilo que produzem. “O dinheiro também pesa, mas acho que, no começo, é mais o desejo de saber se é bom – como se ficar de fora da lista de selecionados fosse um atestado de ruindade”, aponta.

Muitos concursos não garantem a publicação da obra, mas dão visibilidade ao autor. “Todos os participantes vão querer conhecer os textos e autores selecionados. Depois, o autor ainda pode enriquecer o currículo literário, enviar release para a imprensa local quando se destaca em algum prêmio e, se houver cerimônia de premiação, ainda tem a oportunidade da troca de experiências com outros selecionados e com os autores da região em que o concurso é realizado”, destaca Domit. A visibilidade pode ser uma chancela para o mercado editorial. O escritor Rafael Clodomiro acredita que os prêmios ajudam a tornar os escritores conhecidos no meio, o que facilitaria a publicação da obra. “As editoras não querem somente autores talentosos na arte de escrever, e sim, também, escritores que estão sendo bem falados, bem criticados”, diz.

O escritor Cristovão Tezza também acredita que os concursos eventualmente facilitem a edição, mas relativiza o papel dos concursos na inserção de um autor no mercado editorial. “Um prêmio pode chamar a atenção de uma editora, mas certamente não será determinante para a decisão de publicar um livro”, defende. O escritor, que foi finalista no Prêmio Internacional Impac-Dublin de literatura e faturou o Jabuti e Portugal-Telecom de Literatura em Língua Portuguesa, conta que nunca escreveu pensando em concursos. “Eles apareciam e eu me inscrevia, assim como mandava meus originais para as editoras. Jamais perdi o sono por não ganhar concurso”, afirma.

Cristovão Tezza, por Guilherme Pupo/Folhapress

Mas ele também acredita que eles podem abrir oportunidades. No seu caso, a menção honrosa no Prêmio Cruz e Souza para a obra Ensaio da Paixão, em 1981, valeu uma edição do livro em 1985. Já a segunda colocação no concurso da Petrobras facilitou a primeira edição de Aventuras provisórias. Mas Cristovão conta que o que de fato começou a lhe dar espaço na literatura brasileira foi a edição de Trapo, em 1988, por uma grande editora. “O mesmo texto que havia perdido dois ou três concursos de romances inéditos nos anos anteriores”, pontua.

A trajetória de premiações de Cristovão Tezza não é nem de longe parecida com a da maioria dos escritores. Muitos tentam concursos há bons anos e nunca conseguiram menções honrosas. Porém, não ser premiado em um concurso não significa necessariamente que um texto é ruim e muito menos que é hora de desistir de escrever. “Quem almeja se projetar como escritor deve antes de mais nada se preocupar em escrever bons livros. Concurso é acidente, não objetivo de vida”, acredita Cristóvão.

O julgamento
Até o dia 30 de setembro deste ano, algumas dezenas de livros de contos e poesias devem chegar à Rua Deputado Lacerda Franco, no bairro Pinheiros, em São Paulo. O endereço é do Grupo Editorial Scortecci, que promove anualmente o Prêmio Literário Livraria Asabeça. Do material enviado, será escolhido no dia 31 de dezembro um livro de contos e um de poesia para serem publicados pela Editora. Até lá, um longo caminho pela frente.

O editor responsável pelo certame, João Scortecci, conta que logo que as obras chegam, passam por uma primeira triagem feita por ele mesmo. Nessa primeira peneira saem os “trabalhos muito fracos” ou “com erros de português”. Ele explica que isso elimina cerca de metade do material. Depois da triagem é montada uma comissão julgadora, formada por escritores, que muda a cada ano. Este ano é provável que sejam contistas e poetas, para avaliarem esses dois gêneros contemplados pelo concurso.

Cada jurado escolhe dez trabalhos e depois discutem e mostram os prós e contas das obras pré-selecionadas. Em um processo nem sempre amistoso, a comissão julgadora deve sair com um único título a ser premiado. Mas, se cada um vota em uma obra, a escolha se complica. Aí a decisão volta a Scortecci, que é o editor responsável. É ele quem dá o voto de Minerva.

“Os jurados vão por uma preferência pessoal. Aliás, todo concurso é muito pessoal”, defende João. Não há um critério geral que norteie os autores na hora da escolha, mas Scortecci dá pistas sobre suas preferências: “os jurados procuram aquilo que é novo, que é diferente, aquilo que pode realmente representar um bom livro”. E o que pode representar um bom livro? A resposta está longe de ser um consenso.

Cristovão Tezza, que já foi membro de várias comissões julgadoras, entre elas a do último Prêmio Sesc de Literatura, conta que julgar dá muito trabalho, pela quantidade de leitura que exige e pela subjetividade inevitável da avaliação. “Literatura não é, e jamais deve ser, ciência exata. Quem entra num concurso deve estar ciente de que será objeto de uma avaliação de momento, segundo determinadas percepções e visões de literatura carregadas de uma inevitável, e de certa forma desejável, dose de subjetividade”, diz.

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